Nos últimos anos vem se discutindo bastante acerca dos motoristas de aplicativos, se existe vínculo empregatício ou não. É unanime o entendimento da necessidade de lei para disciplinar o tema, para que o judiciário não tenha que fazer o papel de legislador.
Não há legislação específica, e diversos motoristas ingressam na justiça pleiteando o vínculo de emprego com as plataformas. Diante deste cenário, as decisões judiciais têm divergido bastante: há quem entenda que existe uma relação de emprego e há quem entenda não existir.
O correto seria que estas relações fossem disciplinadas em lei, que o Congresso se debruçasse sobre a questão regulamentando o trabalho dos motoristas. Todavia, diante da inexistência de legislação, o problema tem sido judicializado cada vez mais, tendo em vista as diversas demandas judiciais em curso das quais o judiciário não pode se esquivar.
A inércia do Legislativo obriga o Judiciário a decidir reiteradamente com base princípios e interpretações que muitas das vezes não são benéficos para nenhuma das partes. Não raro o Judiciário é criticado por suas decisões, porém, deve-se ter em mente que ele é obrigado a observar o princípio da inafastabilidade da jurisdição, conforme dispõe a Constituição Federal: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
A tendência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) tem sido pelo reconhecimento do vínculo empregatício. As empresas têm recorrido para o Supremo Tribunal Federal (STF) na tentativa de reverter estas decisões.
Recentemente chegou ao STF um recurso da UBER, e a Corte suprema decidiu que este tema sobre o vínculo empregatício entre motoristas e aplicativos tem repercussão geral, e será julgado pela totalidade dos seus membros. Quando um assunto é julgado em sede de repercussão geral, a decisão vincula a todos, exceto o Legislativo.
Os Ministros do STF, em decisões nas reclamações trabalhistas que chegam à Corte, têm derrubado sentenças e acórdãos da Justiça do Trabalho, ou seja, discordam do entendimento de que existe vínculo empregatício na relação discutida. Para os Ministros, o entendimento da Justiça do Trabalho, ao julgar favoravelmente aos motoristas, viola a jurisprudência do STF que validou a terceirização em todas as etapas do processo produtivo.
A dúvida neste momento é se o STF, quando for julgar o tema em repercussão geral, adotará a tese da terceirização (ADPF 324) nos casos dos aplicativos de transporte, pois estas plataformas não são meras intermediadoras entre o consumidor e os prestadores de serviço.
Paralelamente a toda esta discussão judicial, o Poder Executivo também se envolveu no tema por meio de um projeto de lei assinado pelo presidente Lula prevendo direito aos motoristas.
No referido projeto há disposições acerca do recebimento proporcional de horas trabalhadas, um salário-mínimo, financiamento conjunto de contribuições para a Previdência e ressarcimento dos custos na prestação de serviços. Os motoristas serão considerados autônomos, tendo em vista a liberdade na decisão de quando e qual horário vão trabalhar, e em qual período ficarão conectados ao aplicativo
Em diversos países a regulamentação desta relação de trabalho tem demonstrado preocupação com a proteção da saúde do trabalhador e o estabelecimento de um seguro acidente. Estas são preocupações genuínas, pois seja como for a regulamentação, a saúde e segurança do trabalhador têm que ser temas fundamentais.
Novas modalidades de trabalho x CLT
Fato é que novas formas de trabalho estão surgindo a cada dia e vieram para ficar. A velha e tradicional relação de trabalho fundamentada no vínculo empregatício disciplinada pela CLT está diminuindo cada vez mais, e é provável que em alguns anos não será nem de longe o que temos hoje.
O Direito do Trabalho não vai desaparecer, terá apenas que se adaptar às novas modalidades de um mundo cada vez mais digital e tecnológico. Esta mudança de cenário não significa que toda forma de trabalho que não seja regulada pela CLT seja precária.
Estamos vivenciando uma fase de transição das relações de trabalho para a era de predominância da tecnologia, da inteligência artificial, na qual os modelos de proteção que conhecemos irão desaparecer e dar lugar a novas tendências.
Diante de todo exposto, a discussão acerca do vínculo empregatício entre motoristas e aplicativos de transporte tem sido bastante presente no Judiciário, quando deveria ter sido regulamentada por lei há muito tempo. Este tema está na iminência de ter uma decisão judicial vinculante do STF, bem como de ter uma aprovação do projeto de lei no Congresso.
Seja qual for a solução, deve-se levar em conta a transformação que vem ocorrendo nas relações de trabalho diante do desenvolvimento tecnológico que tem imperado nos últimos tempos. O Direito do Trabalho precisa inovar e acompanhar a tecnologia e as novas modalidades das relações trabalhistas.
06/03/2024